O ambientalista reflete sobre o futuro do planeta, analisa o governo Bolsonaro e discute as posturas ecológicas do mundo corporativo
Quando criança, João Paulo Capobianco pa...
O ambientalista reflete sobre o futuro do planeta, analisa o governo Bolsonaro e discute as posturas ecológicas do mundo corporativo
Quando criança, João Paulo Capobianco passava as férias na fazendo do avô, em Minas Gerais, e nada parece ter marcado mais sua juventude do que a imponência dos jequitibás-rosa que cresciam naquele terreno. Desta época, Capô, como é conhecido, herdou o amor pela natureza e um tino para o agronegócio. Produtor de café orgânico e biólogo de formação, ele já conta mais de quatro décadas trabalhando em favor da conservação do meio ambiente. Entre seus trabalhos mais importantes estão a fundação da Fundação SOS Mata Atlântica e o período em que passou no Ministério do Meio Ambiente, entre 2003 e 2008, quando foi responsável pela redução de 54% nas taxas de desmatamento da Amazônia.
Apesar do trabalho incessante, o ambientalista encara a realidade com desânimo: “É muito difícil que a gente tenha futuro, mas já mudamos muito de cinquenta anos para cá. Nós estamos trabalhando para construir uma plataforma de onde vai sair uma solução. A dúvida que eu tenho é se vamos inventar isso a tempo”.
Em um papo com o Trip FM, Capobianco ainda analisa o governo Bolsonaro e as tentativas do mundo corporativo de adotar posturas ecológicas.
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Trip. O seu avô foi uma pessoa que tentou defender uma área de floresta em um tempo em que isso não era muito comum. Quem foi ele?
João Capobianco. Ele não era um ambientalista. Foi um produtor de café muito dedicado, mas que tinha uma ligação fortíssima com a floresta. Cerca de 70% do seu terreno era preservado e entre várias espécies simbólicas, existiam ali os jequitibás-rosa. Era uma coisa inacreditável: treze homens não conseguiam abraçar algumas das árvores. Ninguém sabe explicar direito o motivo, mas com a crise de 1929 ele foi o único que não vendeu madeira para superar as dificuldades financeiras; a mata dele foi a única que sobrou. Quando ele morreu, veio a partilha entre os nove filhos e uma das primeiras providências de alguns deles foi derrubar as árvores. Ali nasceu meu veio de ambientalista, para defender aquilo que meu avô defendeu a vida toda.
Na sua visão, de alguém que estuda o meio ambiente faz quatro décadas, qual é o estado do planeta neste momento? Nem nos mais radicais discursos alarmistas da questão ambiental poderíamos imaginar que chegaríamos em uma situação tão concreta quanto a atual. É comum que o ambientalista tenha um discurso exagerado, quase catastrofista, para poder mostrar a gravidade das coisas. A imprensa só cobre o que é grave. Mas o fato real é que hoje até nós nos surpreendemos. Nenhum de nós imaginava que a aceleração das transformações fosse tão grande e tão disruptiva. Os estudos também foram ganhando muita densidade – hoje os relatórios são inquestionáveis e não há mais dúvida sobre o que está acontecendo, a não ser para meia dúzia de negacionistas. O ser humano sempre foi o ator principal no domínio da natureza, mas se não houver de fato uma ação, nós vamos ter o clima como o nosso principal inimigo, coisa que nunca aconteceu na história da humanidade.
O quanto a gente como nação está se afundando com as ações tomadas por este governo? A partir da constituição de 1988, houve sempre um avanço – em alguns governos maior e em outros menor – na conservação do meio-ambiente. Com a eleição de Bolsonaro, acontece uma ruptura histórica. Mais do que reduzir a gestão ambiental a algo desimportante, houve retrocessos. Ao mesmo tempo em que o governo retirou o controle ele estimulou a ação predatória. Para retomar uma condição de governabilidade haverá muita reação.
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