Sem papas na língua, o chef e estrela do Masterchef fala sobre a infância na França, a dificuldade em lidar com dinheiro e maconha
Quando estreou como jurado no Masterchef, Érick Jacquin – já muito premiado e reconhecido por seu trabalho em algumas das cozinhas mais celebradas de São Paulo – andava em baixa. Não por suas receitas, mas porque sempre foi um péssimo administrador. Um gastador confesso, ele precisou trabalhar duro para sair de um buraco financeiro e chegou a declarar que nunca mais assinaria uma carteira de trabalho na vida. "Nunca vi pobre falar que dinheiro não dá felicidade. Eu gosto de gastar dinheiro, mas não sou um bom administrador. Sou da moda antiga, gosto de ter o papel na mão. Mas precisa ser generoso com o dinheiro, quando a gente tem, deve ajudar os outros", diz.
Um fã de teatro e do circo, começar na televisão foi mais um sonho realizado do que um golpe de sorte. Como há muito já não acontecia na cozinha, Jacquin se colocou como aprendiz e contou muito, principalmente, com a ajuda da apresentadora Ana Paula Padrão. Não demorou para que o seu sotaque carregado apesar dos quase trinta anos no Brasil e seu jeito sem papas na língua lhe transformassem num sucesso. E não foi somente o bolso do chef que se beneficiou por essa volta por cima. A capital paulista voltou a ter os seus pratos figurando em – por enquanto – três estabelecimentos diferentes: o Ça-Va, o Président e o Buteco do Jacquin, sendo que uma casa com pratos italianos deve estrear em breve.
Um menino de infância feliz, que voltava da escola de bicicleta para saborear os pratos da mãe, no interior da França, Érick Jacquin bateu um papo com o Trip FM sobre maconha, crítica gastronômica, dinheiro e mais. Ouça o programa no Spotify, no play nesta reportagem ou leia um trecho da entrevista a seguir.
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Trip. A gente gosta de começar falando sobre o lugar de origem. Como era a sua família quando você era criança? Como foi a sua infância?
Érick Jacquin. Eu nasci de uma família normal, no interior da França, em uma cidade pequena. Fui criado ao lado de três irmãos. Sou o caçula, então todos dizem que sou o preferido. Eu comi muito bem: minha mãe cozinhava e ainda cozinha muito bem. O meu pai reformava castelos no Vale do Loire. Era uma família que precisava trabalhar, mas que me deu uma infância maravilhosa. Nunca comi na escola, sempre voltava para almoçar em casa, de bicicleta. Eu até me arrependo de ser adulto.
Quando a gente olha para a França, vê um ponto positivo: é o Estado que provê uma série de benefícios para o cidadão. Você consegue dizer, pensando por um outro ângulo, quais são os defeitos da França hoje? Eu acho que os franceses são preguiçosos, eles não querem mais trabalhar. É um outro tipo de França daquela que eu conheci em Paris quando tinha vinte anos. Ninguém quer ser mais o cozinheiro que eu fui, que trabalhava de sábado e domingo. Hoje é um momento diferente. Os impostos são mais caros e a França dá tudo, mas pode ser que ela dê demais. Os franceses hoje recebem mais do que dão. No Brasil é ao contrário, aqui falta receber mais.
Existe uma tese que diz que amar o trabalho pode ser uma armadilha capitalista e que a alegria é geralmente encontrada fora do emprego. Você concorda? Cada trabalho é diferente. Eu nunca trabalhei na minha vida, não combina comigo essa tese. Eu só me diverti. Isso combina muito bem para alguém que passa o dia no computador, que talvez ganhe muito dinheiro, mas que passe o dia inteiro falando de número. Isso é escravidão moderna. Cozinhar é um trabalho? Não é. Hoje eu fui em todos os meus restaurantes, fui fazer teste de cardápio, conversei com gente diferente, fiz foto, gravei meu programa de televisão. Não é trabalho, é diversão.
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