Neurocientista e futurista dá sua visão sobre a evolução da espécie e prevê duas formas para o nosso fim
Talvez o fim do ser humano venha permeado por dor após uma série de eventos catastróficos, sejam eles causados pelo efeito estufa ou por guerras bioquímicas que estejam por vir. Por outro lado, o nosso medo de morrer pode seguir trazendo avanços na ciência, com tanta protética, tantos caminhos de substituição de elementos biológicos por elementos sintéticos que chegaríamos ao ponto de criar uma subespécie que em pouco se assemelharia a forma como somos hoje. Dessa maneira, o fim da humanidade seria sem gritos. Frear a velhice, por mais paradoxal que pareça, poderia então gerar o fim da espécie humana. É assim que pensa sobre a finitude o futurista Álvaro Machado Dias, um pós-doutorado em neurociências que tem ganhado espaço na mídia com a forma clara e provocativa que pensa sobre a tecnologia.
Filho de professores, Álvaro se formou em psicologia e durante muito tempo viveu em ambiente laboratorial, o que foi um peso para a sua natureza extrovertida. Acabou mudando de vida e iniciou um diálogo mais aberto com o mundo, pensando sobre assuntos que às vezes parecem saídos de um filme de ficção científica. A guinada ele atribui a uma depressão: “Tem sofrimentos na vida que são muito bons. A gente precisa passar por eles porque são como molas que vão nos levar para outro lugar. Não vamos esquecer que se a depressão não crônica fosse desadaptativa, teria sido eliminada pela seleção natural. Tem alguma coisa de base que faz ela ser prevalente na espécie”, diz.
Em um bate papo com o Trip FM, o cientista ainda falou dos rumos das redes sociais, capitalismo, e drogas. Confira no play aqui em cima, no Spotify ou leia um trecho a seguir.
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Trip. Você tem um estudo recente sobre velhice que vê uma felicidade entre os mais velhos, é isso?
Álvaro Machado Dias. Alguns cientistas vêm colocando a velhice como uma espécie de doença, que seria essa alteração de dentro para fora que nos levaria a um estado de declínio físico indesejável. Meu entendimento é de que isto está errado. É uma visão míope que assume uma posição reducionista de que o envelhecimento é meramente a redução do escopo existencial, quando estudos mostram que a felicidade cresce em pessoas mais velhas. A minha tese é que a capacidade de metacognição, a habilidade de pensar sobre nós mesmo, melhora nas pessoas mais velhas. A gente ganha coisas na velhice que não se reduzem ao chavão da sabedoria. Isso não é conhecimento acumulado é uma habilidade que é desenvolvida.
Como você vê o estudo de práticas ancestrais, como a ayahuasca? A gente está se aproximando dessas culturas antigas? Como instrumento de espiritualidade, eu seria contra o uso da ayahuasca na psiquiatria. O caráter espiritual cria um tipo de especificidade irreprodutível. Mas a ayahuasca também traz propriedades químicas ligas a sistemas neurotransmissores muito específicos. Ciência de verdade é pegar uma área em que tudo o que vem de novo reproduz o que já existe e propor algo diferente. A quetamina, esse anestésico usado como droga de balada, por exemplo, surge neste século como um dos remédios mais importantes contra a depressão. As drogas têm seus efeitos neuroquímicos independentes de qualquer ritual e por isso elas podem ser transformadas em nova terapêuticas para uma melhora holística do paciente.
Como será o futuro das redes sociais? O modelo do vídeo curto imposto pelo TikTok se tornou hegemônico. Qual é a diferença com o Instagram? Do ponto de vista algorítmico, o Instagram parte da comunidade. Já no TikTok á ideia principal é a da exposição geral. É como no capitalismo chinês: o pequeno grupo não existe e todo mundo é exposto a tudo e vigiado o tempo inteiro. É o fortalecimento da lógica de que o mundo é uma grande planície chinesa e todo mundo é exposto a todos os conteúdos e mapeado em todos os seus comportamentos.
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